sábado, 29 de outubro de 2011

6º Jantar Gastronómico | Novembro 2011 | Tema: Game Night

GAME NIGHT IS ON!
 
O que se come numa game night?

João, Rita... e o Mar



Se em 2006 um qualquer comité gastronómico tivesse atribuído um prémio de restaurante revelação, o Vin Rouge teria sido certamente um sério candidato. Na altura vários foram os entusiastas que demonstraram o seu contentamento - em jornais, blogues e fóruns - por este pequeno restaurante meio perdido em Amoreira, algures no Estoril. Não é que a comida fosse o superlativo dos superlativos ou particularmente original, mas porque os proprietários reuniam um conjunto de características que lhes trouxe reconhecimento e proveito. De facto o profissionalismo e a simpatia de Rita Caldas, na sala, as propostas contemporâneas de base portuguesa (e de escola francesa) de João Antunes, na cozinha, uma carta de vinhos curta mas interessante e uma conta justa no final, eram argumentos de sobra para uma refeição a preceito – até se perdoava a localização e o espaço que poderia ter sido um stand de automóveis. 
Em 2010, depois de alguma insistência, aceitaram o convite do hoteleiro Simões de Almeida e transferiram-se para o lugar onde funcionara o 100 Maneiras, na estalagem Villa Albatroz, em plena baía de Cascais. 


O percurso não tem sido fácil. A conjuntura económica está como se sabe e Cascais é, por vezes, uma terra madrasta - segundo alguns locais, um morador da região mais facilmente se desloca a Lisboa ou ao Guincho para jantar do que a Cascais. Acresce ainda que apesar do espaço ser de dimensão semelhante ao anterior a distribuição por várias salas obrigou a um aumento da equipa.

Contudo Rita Caldas e João Antunes - dois profissionais com passagens por restaurantes como o Valle Flor (ela), Ritz, Fortaleza do Guincho e 100 Maneiras (ele) - vão contando com a presença dos seus clientes de sempre e também de muitos estrangeiros, sobretudo, turistas em época alta. 

De resto pouco parece ter mudado. A carta de comidas continua a ser pequena mas interessante, a de vinhos idem, os preços pouco ou nada se alteraram e até alguns dos adereços mais sóbrios foram transpostos da anterior morada.

A carta de comidas, como referi, é pequena mas interessante (5 entradas, 3 pratos de peixe, 3 pratos de carne, 3 ‘risottos & pastas’ e cinco sobremesas) pelo que a opção pelo menu de quatro pratos ao critério do Chef (39,90€) é uma hipótese a considerar.
Em matéria de vinhos o Vin Rouge continua bem. Tal como referi no inicio, a carta é relativamente pequena (6 champanhes/espumantes, 25 brancos, 33 tintos, e 13 vinhos de sobremesa, entre colheitas tardias e fortificados) mas com vários pontos de interesse e referências menos óbvios. A lista está dividida de forma clássica (por regiões) e em cada vinho, vem referido o nome do produtor, as castas e notas de prova. A temperatura de serviço foi correta e a politica de preços sensata. Não só há várias soluções a abaixo dos 20€ como há casos em que a margem não é elevada, como no caso do belíssimo Soalheiro Primeiras Vinhas 2010 que bebemos (24€).
Por ultimo o serviço correu de forma fluida e profissional. Não só pela parte da anfitriã, como esperava, mas, também, por parte dos empregados que nos atenderam.

O Vin Rouge continua, portanto, a ser uma casa muito recomendável. Esperamos que apesar da conjuntura e de algumas vicissitudes do lugar consigam manter o nível e, se possível, melhorar um ou outro detalhe. A cozinha de João Antunes e a dedicação da equipa merecem-no. E nós também. Do prazer de desfrutar desse momento e da vista.

By Miguel Pires

Uma estrela nas mãos de Aimé Barroyer




É um dos mais antigos restaurantes de luxo da Península Ibérica (1861). Pelas suas mesas passaram figuras ilustres das mais diversas áreas, da literatura à politica, do cinema às finanças. Em 150 anos de vida o Tavares viveu momentos de glória e de estabilidade, mas também de declínio e de insucesso, de que são exemplos as sucessivas falências que se deram nos anos 40/50. Infelizmente na sua história recente os períodos conturbados voltaram a repetir-se: desde 2004, o restaurante mudou duas vezes de proprietário e cinco vezes de Chefe de Cozinha.  

Mas foi também neste período, sobre o comando do Chef José Avillez, que alcançou o seu maior feito gastronómico ao ser galardoado dois anos consecutivos (2009 e 2010) com estrela michelin. Como é sabido José Avillez  sairia em Janeiro deste ano em rotura com a administração. Problemas financeiros, que se traduziram no incumprimento de prazos de pagamentos a fornecedores, como veio a lume na imprensa, terão estado na origem dessa ruptura.

Quando muitas pessoas temiam um novo definhar era anunciada a contratação de Aimé Barroyer para tomar as rédeas da cozinha e dar um novo fôlego ao projecto. O estilo de cozinha e o seu currículo, que incluiu passagens pelas cozinhas de Joel Robuchon e Paul Bocuse, parecem apontar nesse sentido.

Em Portugal, este Chef francês, casado com uma portuguesa, criou e dirigiu o restaurante Valle Flor, do Hotel Pestana Palace (Lisboa), onde ficou conhecido pela obsessão pelas cozinhas e produtos regionais portuguesas, muitos deles de baixa consideração e até pouco conhecidos fora das suas regiões. Barroyer deu-lhes um estatuto e a sofisticação que poucos imaginaram – é preciso ver que se vivia um período de deslumbramento em que se valorizava muito certos produtos estrangeiros, do (hoje banal) magret de pato, ao foie gras, das vieiras ao pombo d’anjou. A sua cozinha no Valle Flor era de facto fascinante. Contudo, apesar de todo o reconhecimento a sua mente criativa e a insistência em conjugar produtos nobres com outros menos considerados, nem sempre resultava de forma brilhante. Por outro lado a cadência com que novos pratos e menus especiais iam sendo apresentados pecavam, por vezes, por falta de afinação o que fazia com que o resultado nem sempre fosse constante. Essa é a principal razão que várias pessoas apontam para o facto de nunca ter ganho uma estrela michelin.

A primeira carta de Barroyer, no Tavares, data do inicio de Março. Apesar dos poucos meses de trabalho o silêncio paira na imprensa e, à data que escrevo estas linhas, pouco mais se conhece do que a apreciação do conhecido critico espanhol Carlos Maribona, do jornal ABC e do blogue Salsa de Chiles.  Maribona, um adepto incondicional do Tavares de Avillez, considerou a cozinha de Barroyer tecnicamente impecável, mas demasiado barroca, chegando a apontar algumas conjugações “verdadeiramente preocupantes”, como foi o caso de um salmonete com foie gras.

Aimé Barroyer  continua fiel à sua cozinha e à sua aposta nos produtos portugueses. A escolha à carta é reduzida (seis pratos, uma sobremesa e um prato de queijos) privilegiando-se os menus de degustação.  

A carta de vinhos inclui vários vinhos de topo, portugueses e estrangeiros, mas pareceu-me desequilibrada dando a sensação de estarem em escoamento de stocks, sobretudo nos brancos onde o desfalque de referencias era acentuado.
Por último o serviço de sala foi positivo: atendimento cordial, coordenado, com os pratos a chegarem-nos no timing certo.  

Em resumo tivemos um jantar agradável com um serviço correcto e um menu com pratos criativos e ligações interessantes, num apelo a uma memória colectiva. Um menu seguro, equilibrado e leve (ninguém ficou com fome, nem empanturrado). Contudo, no final, ficou a sensação que faltou qualquer coisa, um certo toque de génio que encontrei, no passado, em certas criações de Aimé Barroyer. No entanto pareceu-me uma cozinha que dignifica o lugar e tem nível suficiente para uma estrela michelin - tenham os inspectores do guia vermelho a sensibilidade e a vontade em compreender certos aspectos locais, algo que nunca foi muito evidente no passado.

By Miguel Pires

Nova pastelaria francesa traz-nos o “veneno do amor” de Paris


 
Entramos no Poison d' Amour e entramos em Paris. E nesta nova pastelaria e salão de chá, no Príncipe Real lisboeta, todos os olhares desaguam de imediato nos pequenos grandes monumentos franceses que se arrumam artisticamente na vitrina que nos recebe. Macarons, éclairs, tartes e tartelettes, bavaroises, mille-feuilles, geografias doces como Paris-Brest ou mesmo Delícia de Lisboa (uma mousse de limão) e tudo com boa vizinhança: croissants, pains aux raisins (parecido com o caracol português), brioches...

A Poison, com sala de chá íntima, sala de cafetaria ou pátio rodeado de Jardim Botânico, quer mesmo transportar-nos para uma requintada Cidade Luz. E não usa só açúcar, mousses ou chocolates como o "veneno do amor". Há ainda pequenos-almoços, almoços ou brunchs.

"Todo o material veio de França" para ser possível cumprir "todo o processo de fabrico francês", explica, sublinhando que "todos os produtos são feitos aqui, todos os dias, de forma artesanal", só com "produtos de primeira qualidade", sem cedências: seja nas "massas folhadas, que são feitas com manteiga, nada de margarinas", seja no chocolate, "dos melhores do mundo, o Valrhona".

É certo que a vitrina de pastelaria cria de imediato o ambiente mas Paris está em todo lado.
Entra-se directamente para o corredor do balcão de pastelaria, que em frente tem a sala de chá, segue-se pelo corredor para uma salinha de cafetaria e chega-se a outra cereja no topo do bolo: uma esplanada completamente rodeada e abençoada pelo Jardim Botânico.

Doçuras
Macarons redondinhos e coloridos, de café, chocolate, baunilha ou framboesa. Éclairs de chocolate, café ou framboesa - e prometidos estão de pistácio ou até violeta. Tartes de chocolate com Ganashe a 75% de cacau, muitas tartes de frutas ou de amêndoa, ou um Brooklyn em camada de três chocolates que é posto em cima de um biscoito caramelizado de avelã. Bavaroises de frutos silvestres e de manga ou tartes de limão-merengue e mil-folhas "verdadeiros" (atenção ao de morango), baba au rum ("briochezinha fininha imprimida de rum com chantili caseiro") e croissants e brioches. Paris Brest, "uma massa de éclair pulverizada de amêndoa torrada com creme de pralinê", e o pains aux raisins ("parecido com o nosso caracol"), tarte Grand Mére, tarte Amandine. E a Delícia de Lisboa, uma mousse de limão assim baptizada para homenagear a cidade. Prometem-se novidades ao longo da temporada. Como referência: um croissant custa 1,60€ e os bolos variam entre 2,80€ e 4,50€ - os macarons vendem-se a 6,80€ por 100gr. Uma "cascata" de miniaturas de pastelaria e "viennoiseries" (croissants, pães) com 10 unidades fica em 9,50€ tal como uma com 10 unidades variadas de macarons. A acompanhar, chás (uma lista de 16 diferentes) a partir de 3,70€ a 4,80€ (um perfumadíssimo chá verde de Jasmim), além de cafés e leites, sumos naturais e limonadas, vinhos (desde 3,20€ o copo) e champanhes (9€ a flûte)

Na ementa
Por exemplo, a manhã pode começar com um pequeno-almoço Elegance, entre "petites viennoiseries" (2 croissants, 2 pains au chocolat, 1 pain aux raisin, 1 brioche, peito de peru fumado, ovos mexidos, pão de sementes de sésamo, pão de sementes de papoila, espetada de frutas de época, doce, mel e manteiga (fica-lhe tudo por 10,80€ mas há menus desde 6,50€). Já para um almoço, e pelo mesmo preço poderá optar por um menu de salada de topo, o Canibal - com carne laminada, cocktail de verduras, batata, picles, beterraba, azeitonas pretas, vinagrette de mostarda de Dijon - ou o Fermière - com fígados de galinha e moelas cozinhadas em vinagre, cocktail de verduras, cenoura ralada, crôutons, maçã, nozes e fígados; ambos por 10,80€ mas com propostas a partir dos 7,80€. Há ainda pratos de charcutarias ou queijos ou tostas de pão caseiro.
By Luís J. Santos

Cantinho do Avillez. Histórias, viagens e a casa da avó



Avillez começa por contar que o espaço é um sonho antigo. "Desde há sete anos, para aí, queria ter um para reunir amigos. Amigos de amigos, com outro registo. Descontraído, mas cuidado." Para isso, criou um restaurante informal, mas atento aos pormenores. Há azulejos Viúva Lamego, louças Costa Nova, Vista Alegre, Vida Portuguesa e Bordalo Pinheiro. A cozinha, afirma, é paralela à simplicidade vs requinte: "É sofisticada, mas simples. Os pratos são tradicionais, aqueles que temos o conforto de saber o que são, mas muito bem feitos e com alguns toques de criatividade e influências de viagens".

O México, foi uma das suas últimas escolhas e aparece no Prego MX LX (do México para Lisboa), servido fatiado, com guacamole, cebola roxa, e outras tantas iguarias sul-americanas. Há ainda o prego à Pequim, inspirado no pato à pequim que comeu num restaurante chinês, mas não na China: "Não é nada específico, mas um aglomerado de viagens, pessoas que me rodeiam, restaurantes e casas onde fui estando." José Avillez deixa claro que foi tudo pensado ao pormenor, e salta de novo para o tema decoração: "É isso. Portuguesa, com influências de viagens, sítios onde estive, peças que gostei, outras trazidas da casa das minhas tias, dos avós. É um conjunto de vivências de várias pessoas, mas focado na minha, no meu crescimento pessoal."

O tradicional português é uma das marcas e estende-se à tal placa onde se lê "Cantinho do Avillez" e que será pendurada lá fora: "Não se refere a um canto, mas ao lugar. É inspirada nas das ruas das zonas históricas e serve para criar esse ambiente do cantinho ser o lugar. O conceito do restaurante é a atenção e o carinho na identidade de cada coisa. Cada objecto conta uma história, assim como cada prato".

Depois da sua surpreendente saída do Tavares, em Janeiro, José Avillez terá agora dois restaurantes a seu cargo. O "Belcanto", mais antigo, vai dar continuidade à alta cozinha que fazia na rua da Misericórdia. O "Cantinho do Avillez", por outro lado, foi pensado para ser mais descomprometido: "Queremos fazer boa cozinha, independentemente de ser tradicional, contemporânea, ou de vanguarda. Há cozinha boa e má e nós marcamo-nos na linha da boa, em vários estilos".

O Chef Avillez afirma que "sentia falta, e saudades, de fazer pratos simples, que trazem memórias" da casa da avó, da tia, da mãe. "É possível tirar tanto prazer no grande bacalhau à Brás, como no Mergulho no Mar [dos pratos mais elaborados que tinha no Tavares]." No "Cantinho do Avillez", o registo é descomplicado e o tacho pode mesmo vir para a mesa. Há almoços, jantares e ceias até às 2h00: "É um registo descontraído, com uma comida de qualidade elevada. Como quando recebemos pessoas em casa. Queremos dar prazer a quem se senta na nossa mesa."
By Maria Catarina Nunes